Roubam-nos a nossa vida injustamente

16/07/2023

Chamo-me Catarina tenho 57 anos, estou detida desde o dia 15/4/2023 o meu processo era de 2016 fui condenada a 5 anos e 3 meses por um crime que dizem que fiz.

Imagine, sempre trabalhei nunca tive problemas com a justiça e condenam-me assim ou melhor roubam-nos a nossa vida injustamente tudo por causa de um ex namorado da minha filha que pediu ao meu ex marido para o levar a Lisboa a comprar, para ele consumir, eu não queria ir eu estava de baixa trabalhava num lar já (h)á 8 anos e tinha feito uma sirurgia a mão, eu não queria ir lá, o meu ex lá me convenceu que enquanto o rapaz ia à vida dele nós iamos jantar ao mac, e foi o que fizemos, quando estavamos a jantar o ex da minha filha pediu a chave do carro ao meu ex devia ser para ir consumir eu tinha no carro a minha bolsa com a minha carteira e disse ao meu ex para irmos embora, chegamos ao carro o rapaz estava deitado no banco de tráz e atrás do meu banco passageiro estava a minha bolsa onde pequei nela e puxei para a frente ao pé dos meus pés, o rapaz disse-me que tinha metido na minha mala o maço de tabaco, fomos embora, ao chegar-mos [chegarmos] a onde morava na entrada da cidade estava uma operação stop se a droga que estava na minha bolsa fosse meu eu tinha tempo de deitar fora mas não sabia o que lá estava eram doses de heroina que era para consumo do rapaz, ele perante os nics (nucleo investigação criminal) admitiu que era dele, mas depois por eu o ter metido fora de casa mudou a versão disse que vendia para nós e em troco lhe dava para ele consumir, foi me dada uma advogada do estado, pois eu não tinha dinheiro para pagar um advogado, ela nunca me defendeu só a vi no dia do julgamento onde me disse para não falar e como eu não conhecia as leis assim o fiz mantive o silêncio e sem testemunhas, sem provas, sem ninguem que me ajudá-se [ajudasse] até o meu ex marido para se defender disse que eu é que quis ir a Lisboa. Levo com prisão efetiva logo assim sendo primária e acusada de traficar 5 anos, não levaram em conta que sempre trabalhei que nunca tive problemas com a justiça até a polícia mentiu ao dizerem que o rapaz nunca assumiu, o que penso é que vivemos neste mundo e não podemos confiar em ninguém.

A advogada para ajudar meteu o recurso fora do prazo e foram-me buscar no fim do meu trabalho estando eu a pôr gasolina nas bombas da minha terra, nem a casa me deixaram ir vim para aqui com a roupa do corpo, fiquei fechada por 3 dias para mim foi como se me tirassem o chão e só pensava, meu deus que foi o que eu fiz para merecer tal castigo, indicaram-me um advogado para ver se ainda conseguia fazer alguma coisa mas ele pediu-me 2000€ e 600€ tinha que dar logo de entrada e ir pagando 100€ por mês mas desisti porque não tenho como pagar, a unia ajuda que vou tendo é da minha filha ficou a tratar da minha casa onde paga 300€ de renda ela trabalha no lar onde eu também estava efetiva até vir para aqui…

Desculpe este meu desabafo e obrigada pela atensão

Sem mais beijinhos e obrigada

About Vozes de Dentro

Somos um grupo de pessoas presas, presos e pessoas que do outro lado dos muros acompanham e participam, de diferentes formas, nas lutas das pessoas reclusas e das suas famílias. As pessoas privadas de liberdade e especialmente as pobres, racializadas, mulheres, transgéneros e crianças enfrentam condições desumanas, violência física e psicológica nas prisões. As histórias destas pessoas são altamente invisibilizadas, e, por isso, expostas a constantes violações dos seus direitos fundamentais (1). Em particular, Portugal é dos países europeus onde mais morrem reclusa/os (2) e as prisões portuguesas têm sido por diversas vezes alvo de críticas do Conselho da Europa, nomeadamente do Comité Contra a Tortura. Conjuntamente, encontra-se entre os países da Europa onde se condena mais a penas de prisão, por períodos mais longos e onde a sobrelotação é uma realidade. Os índices de encarceramento são altos especialmente entre as mulheres, também condenadas a penas maiores, e não existem dados oficiais sobre o número de pessoas transgénero, bem como sobre a pertença étnico-racial (1, 3). Testemunhos de reclusas e reclusos e seus familiares indicam o frequente recurso a fármacos sedativos, anti psicóticos e anti convulsivos sem uma conexão clara com a necessidade clínica dos próprios fármacos, mas mais claramente em coerência com a atitude repressiva do sistema prisional (4). A maioria dos estabelecimentos prisionais caracterizam-se por graves problemas nas infraestruturas, péssima alimentação, falta de acesso a bens e produtos essenciais. Os cuidados de saúde são também precários e deficitários, com a maioria de profissionais de saúde subcontratada. A atividade laboral remunerada é parca e traduz-se, maioritariamente, na exploração e as ofertas formativas são poucas. Isto, aliado à baixa aplicação de medidas de flexibilização de penas, ao inexistente apoio para a reinserção social, ao isolamento social a que ficam sujeitas as pessoas presas com severas limitações de contato com as suas famílias e comunidades e os percursos prévios de institucionalização que muitas viveram previamente à prisão, configura os ciclos de pobreza-exclusão-institucionalização-violência (5). Na prisão as discriminações, violências e a exploração persistem e são exacerbadas remetendo-as para invisibilidade, abandono social e marginalização. O objetivo deste grupo é de visibilizar a realidade obscurecida das prisões e pensar coletivamente possíveis ações de apoio para quem está dentro. View all posts by Vozes de Dentro

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